quinta-feira, 25 de novembro de 2010

QUANDO O MAL BATE EM SUA PORTA

Crônica do livro Enquanto escorre o tempo, escrito por Patrícia Gebrim,
Editora Pensamento, 2010.

QUANDO O MAL BATE EM SUA PORTA

Quem nunca foi feito de bobo ao menos uma vez na vida? Quem nunca foi enganado por alguém... traído... ferido... humilhado talvez? Quem nunca saiu para passear com
um meigo cordeirinho, de pelos brancos como a neve, e acabou caindo na boca do lobo mau de olhos vermelhos e baba maldita?

Confesse... uma vezinha ao menos já deve ter acontecido com você. Cada um de nós já passou por uma situação como essa na vida. Eu vejo, todos os dias, coisas assim
acontecerem. Vejo pessoas serem feridas por outras, cujos valores seriam impublicáveis. Por que isso acontece? Por que as pessoas se permitem ser enganadas assim?

No meu entender isso acontece porque nos faltam basicamente três coisas. Três qualidades antilobo mau: Maturidade, Sabedoria e Autoestima.

O problema é que não nascemos com tudo isso, vamos conquistando cada qualidade dessas aos poucos, na medida
em que caminhamos pela vida. Quanto mais amadurecemos, mais sábios nos tornamos, vamos aprendendo a perder a ingenuidade, a reconhecer e evitar os perigos. Assim,
acabamos aprendendo a reconhecer o cheiro de lobos maus. É um cheiro ácido, um pouco enjoativo, uma mistura de tabaco, estrume e fel, que traz um amargor à nossa
boca e um descompasso ao coração.

Nem todos têm, logo de cara, um bom olfato; assim, é impossível evitar sofrer uma queda ou outra de vez em quando. É impossível evitar alguns encontros com aquele
monstro medonho e sua boca fedida, ornada por uma fileira de dentes afiados. É impossível passar pela vida sem um ou outro arranhão.

Ok, o arranhão aconteceu, a mordida está ardendo na sua pele... A questão é: o que fazer depois disso? o que fazer quando percebemos um animal horrendo e cheio de
dentes rasgando a nossa pele sem dó? o que fazer ao perceber que fomos enganados, feridos, maltratados? o que fazer quando alguém trai nossa confiança, nosso maior
bem, ingênua e docemente depositado em mãos, ou patas, erradas?

O primeiro impulso é bem ruim, acreditem. Primeiro vem uma vontade de matar a nós mesmos. "Como puuude ser tão idioootaaaa?" E depois, uma vontade de matar o lobo.
"Cadê o lenhadoooor?" (aquele que na história da Chapeuzinho Vermelho ajudou Chapeuzinho a livrar-se do lobo, lembra?).

Em um primeiro momento, queremos acabar com o lobo maldito, arrancar sua pele, matá-lo, esquartejá-lo! - se você já foi atacado por um lobo, saberá do que estou
falando. Mas será que vale a pena? Vai mudar o que já aconteceu?
Se fizermos isso, não estaremos vivenciando uma outra traição? Não estaremos traindo a nós mesmos, os nossos valores, as nossas crenças? Será que temos de deixar
de ser quem somos, só porque um bicho peludo agiu de forma ruim?

Ah, quer saber? Não se traia. Não se abandone. Não se puna pelo que ocorreu nem fique aprisionado em uma tentativa de punir o outro. Resista à tentação de se vingar.
Isso aprisiona você.

Use o ocorrido para aprender. APRENDA! É a única coisa que poderá evitar que isso se repita. Aproveite a proximidade do lobo e dê uma boa cheirada nele, inspire
profundamente aquele odor assustador e registre-o em suas células olfativas, pregue em cada uma delas uma plaquinha vermelha com a palavra PERIGO!!

Perceba qual foi a sua participação em permitir que aquilo lhe acontecesse (não há vítimas, apenas falta de consciência), e siga em frente. Não permita que ninguém,
ou nenhuma situação, mude a crença positiva que você tem a seu respeito. Se o outro mentiu, traiu, feriu... foi "ele" quem fez isso, e será ele que terá de conviver
consigo próprio por cada momento de sua odiosa vida. Não siga o mesmo caminho.

Apenas afaste-se, o máximo que puder. Corte todas as possibilidades de essa pessoa ferir você novamente. Vire a página, volte a prestar atenção em sua própria respiração,
em seu próprio Ser, volte a criar a sua vida como acredita que ela deva ser.

Não se torne um lobo também, por favor, não faça isso. Digo isso, porque sei que todos nós temos também uma parte "lobo" (ninguém é só "cordeirinho", acredite!).
Mas não a desperte por vingança. Não por vingança. Se um dia você a trouxer à tona, se quiser sentir a pele de seu lado lobo, que seja para proteger você, e não
para atacar.
Que seja para te fazer correr livre e selvagem pelos campos, e não para abocanhar. Que seja para te fazer sentir o prazer da vida, e não para matar!

O mundo já tem lobos demais, um bando de gente que baba e morde sem razão, mas no final das contas o que de verdade importa é quem cada um de nós escolhe ser. Esse
é o único lugar onde podemos ser livres de verdade. Escolher está além de "reagir". Se você reage, não está escolhendo, pense nisso. E se não escolhe, não exerce
a sua liberdade.

Escolha continuar sendo quem você é, não importa quais sejam as escolhas das outras pessoas!

"Ensinar é um exercício de imortalidade. De alguma forma, continuamos a
viver naqueles cujos olhos aprenderam a ver o mundo pela magia da nossa
palavra. O professor, assim, não morre jamais..." - Rubem Alves


"Todos esses que aí estão
Atravancando meu caminho,
Eles passarão...
Eu passarinho!"

(Mário Quintana)

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